Como antropólogo, historiador e arqueólogo, estou e continuo preocupado com o patrimônio histórico e cultural de nosso País. Na realidade, falando com franqueza, nunca estive tanto, nem jamais o senti tão ameaçado como nesses tempos presentes. E explico.
O maior patrimônio de nossa Nação é ela própria, seu território, seu povo, sua história. No meu entender, tudo isto está em grande perigo. A Nação, de desaparecer; o território, de se desmantelar como União; o povo de se perder na desesperança; a história, de ser enxovalhada.
Alguns, os mesmos, irão chamar-me de radical, pessimista, derrotista e outros ‘istas’. Talvez o seja, nem sei. Mas uma coisa eu sei! Não será a primeira vez que serei assim rotulado. Ultimamente, no entanto, tenho saído relativamente ileso desses desafios, ao menos no longo e médio prazo. Relativamente, é claro, no que se refere à capacidade de inferência sobre fatos, ao entendimento das relações de dados disponíveis, à análise dos mesmos, à apreciação das conjunturas existentes, assim como em relação á compreensão da psicologia das massas e no julgamento das características insuspeitadas e ocultas de indivíduos públicos. No mais, no entanto, isso não me garantiu nenhuma medalha, glória, recompensa ou melhoria. Nem mesmo gáudio. Nada. Talvez tenha sido mesmo pior para mim, pois, não obstante ter escapado ileso intelectualmente, assim mesmo perdi, por ter sido prejudicado por patrulhamento ideológico capcioso. Politicamente, também perdi, por três vezes. E perdi porque fiz o que considerava o melhor para o País.
Na primeira vez, naquele quase esquecido plebiscito para escolher a forma de governo, escolhi a monarquia constitucional, que considero não a panacéia universal, mas a que mais dificulta a corrupção fácil, aberta e transparente, como em nosso atual sistema político. Bummm! Perdi!
Na segunda, porque votei contra Lula, por minhas convicções e conhecimento histórico. Bummm! Novamente perdi.
Na terceira, votei CONTRA Lula e até alimentei esperanças, pois o segundo turno prometia uma luta ferrenha. Quem ganhasse o faria por muito pouco, e o saudável contraponto democrático estaria instalado. Mas, para minha surpresa: Bummmm! Perdi, e pasmem, por uma diferença de votos pale qual jamais consegui explicação.
No pebiscito da froam de governo, esperava que houvesse uma votação mais expressiva querendo o retorno da Monarquia, a demonstrar um amadurecimento político do eleitor. Ledo engano.
Mas nas eleiçoes presidenciais, foi pior. na primeira, olhei atônito para as pessoas e nunca as vi tão imaturas. Não entendi a origem daquela alegria algo inconseqüente, pois estavam a entregar uma enorme e complexa nação a um bando de inexperientes, ávidos de poder, sedentos de cargos, ansiosos pelo turno que lhes caberia. Só esperavam que os incautos lhes entregassem o pote cheio para que pudessem se lambuzar de mel. Esses eleitores, e conhecia a muitos deles, que me pareciam experientes e estavam no auge produtivo da idade, no cimo da percepção das coisas da vida, mais se portavam como torcedores de futebol, felizes com alguma vitória de seu time, do que com pessoas que estavam delegando poderes que afetaria a vida de mais de cem milhões de outras pessoas. Pareciam estar vingando-se de alguém, ou de algo. Estavam cheios de esperança de que alguém que jamais fizera nada produtivo produzisse. De alguém que era comandado (por um grupo internacional de esquerda) liderasse.
Fiquei pasmo e sentindo-me inconfortável. Estaria eu errado? Falhara-me o julgamento? Estaria enganada aquela multidão prenhe de certezas, radiante de felicidade, de dentro da qual alguns me olhavam de soslaio, fazendo-me mofa? Marchariam todos eles com o passo errado, e somente gente como eu, com o certo? Restava esperar. Para infelicidade dessa Nação (azarado país, como disse um dia meu finado Pai quando um tal Jânio foi eleito) eles tinham brincado com algo muito sério, e logo tudo começou a demonstrar que a eleição fora um engodo.
Na terceira, após alguns anos assistindo ao enorme amontoado de escândalos de malversações de dinheiro público, e, pior, com a banalização dos atos desonestos, pareceu que o povo acordara da letargia 'democrática' com que tanto sonhara. O sonho virava mal dormir. E o Lula balançou. Sentiu-se perdido. E estava, como demonstrou a votação no primeiro turno. Mas não sei o que houve e, subitamente, ele tornou-se um inimaginado campeão de votos. Talvez um dia a História descubra se houve algo além das urnas eletrônicas.
E aí começou a verdadeira debâcle, a suprema desmoralização das tradições do Brasil. resolveram comprar tudo: consciências, pessoas, deputados, seadores, jornalistas, juízes, desembargadores. E encontraram um mercado com uma enorme oferta, desejosos quase todos de se locupletarem. Para tanto somente era necessário iludir aos brasileiros sem honestidade e brio pessoal, comprando-lhes as vontades pela barriga. Alimentaram a alguns, é claro, como se engorda porcos para o abate. No entanto, tiram-lhes a dignidade e o orgulho de ser um homem, uma mulher, um pai, uma mãe.
Foi um logro na boa fé das pessoas? Houve uma total desatenção à gravidade do assunto? Uma ingenuidade de cordeiros perante a sagacidade de lobos? Se foi assim escuto-os, aos que receberam o mandato, novamente, rindo às bandeiras despregadas.
Que ingenuidade! Como esperar que ex-guerrilheiros sejam bons administradores? Como esperar que sejam liberais? Como esperar que não se protejam uns aos outros independentemente da situação?
Mas eles disseram-se democratas. Disseram que haviam lutado pela democracia. Quando? Onde? Eu já era um jovem naquela época e não vi nada disso. Só escuto isso hoje. Não me lembro de que algumas daquelas organizações terroristas - que assaltavam bancos e matavam pessoas - tenham pedido a reposição de Jango ao poder. Afinal, ele era o presidente deposto. Isto teria sido democrático. Mas não houve. Assaltavam bancos – e matavam pessoas inocentes -, não para roubar, mas para, eufemisticamente, apropriarem-se de fundos em nome do povo. É um ato democrático? Hoje, os organizadores daqueles assaltos, comandam estruturas governamentais de importância. Ninguém lembra disso. E mais: recebem salários de compensação, indenizatórios, porque fizeram tais coisas, ou em decorrência de fatos ligados a elas. E eu, honesto, não recebo. Não é à toa que eles estão sempre sorrindo, felizes.
Nada disso, entretanto, aconteceu por acaso. Nada foi um golpe de sorte ou a roda da fortuna. Não! A inversão de valores que existiu foi apregoada pelo italiano Antônio Gramsci, o complemento de outro italiano, Nicólo Maquiavel. Este, ensinava como manter o poder, aquele, como tomá-lo. Gramsci foi brilhante em seus ensinamentos. Na realidade, criou um tipo de manual de tomada do poder, aplicável a qualquer ideologia, a qualquer partido, em qualquer tempo. De maneira simplificada, resumia-se na tomada silenciosa das estruturas coletivas da sociedade civil. E isto é fácil quando se é dissimulado. Traduzindo, para os dias de hoje, apregoava que se apoiassem as causas de simpatia geral, aquelas que emocionam o coração de todos; daquelas que não trazem transtornos, nem ansiedades, nem remorsos e, é claro, que não solicitem maiores responsabilidades.
Que se dominasse a igreja, as escolas, as universidades, os sindicatos, os clubes, as associações de classes, os diretórios estudantis, e quaisquer grupos, mesmo os de escoteiros. Que se dominassem todas as agremiações independentemente de sua importância. As editoras, a imprensa, as Comissões Editoriais, os Museus, até mesmo os grupos de dança e de folclore. Qualquer coisa desse tipo. Muitas delas não apresentam o menor apelo. São fáceis de serem conquistadas. Ninguém as quer. Que sejam dominadas. Que sejam desejadas. Que sejam dadas declarações de apoio a causas e questões humanitárias, tornando-se campeões dos Direitos Humanos, da Ecologia, mesmo que de maneira inconseqüente, sem nenhuma racionalidade. Que solicitem, de quem governa, respostas comprometedoras, e atitudes tresloucadas. Que sejam feitas propostas enganosas. Que se criem situações inescapáveis, do tipo: se não fizer, é perverso, se fizer, é suicida.
Enquanto tudo isso acontece, que se deixe os outros governarem. Mas que haja implacabilidade na oposição. Que haja rudeza, grosseria, dureza, impavidez. Que sejam inamovíveis em suas posições, peremptórios e inamistosos. Que seja criada, finalmente, uma personalidade grupal, uma identidade coletiva, forte e irascível, que acene com a segurança para quem dela se aproxime. Que a organização tenha grandes asas para abrigar os ativistas fanatizados e irracionais. Então, estar-se-á no ponto de impingir à população o desejo de beber do ‘elixir’ da Nova Ordem.
Esta é a chave da proposta gramsciana: que o povo deseje ardentemente, com uma pulsão quase que sexual que um grupo político seja guindado ao poder, que uma ideologia mágica os comande. Assim o poder cairia no colo desse grupo como uma fruta amadurecida cai da árvore.
E não foi o que aconteceu?
quarta-feira, 10 de março de 2010
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